A terceira rodada de debates promovida pelo Fórum Permanente
de Debates Culturais do Grande ABC, Cultura sem Carimbo, teve como convidados
do mês de agosto, seu Marotti e Ditinho da Congada, que assim foram
apresentados por Neusa Borges, que exerceu a função de mediadora:
"João Luiz Marotti, mais conhecido como Luiz Marotti,
nasceu em São Bernardo do Campo. É presidente do Centro Recreativo e Cultural
Alameda Glória - mais conhecido como Clube do Alameda-. fundado há mais de seis
décadas. Há mais de cinquenta anos, promove as famosas festas juninas no clube,
sendo que durante várias décadas, foi marcador oficial da premiada Quadrilha
Junina do Alameda. Atualmente, aos 83 anos de idade, é marcador da Quadrilha
Junina do grupo da 3ª Idade da Associação dos Funcionários Públicos de São
Bernardo.
- Benedito da Silva Lemes, o Ditinho da Congada, nasceu em
Monsenhor Paulo, MG. Ainda menino, mudou-se para São Bernardo do Campo, onde
reestruturou o grupo de congada criado por sua família havia mais de um século.
Ditinho da Congada é o mestre do Grupo Folclórico Congada do
Parque São Bernardo, e também presidente da Escola de Samba Renascente do
Parque São Bernardo. Há quinze anos, está à frente da organização do famoso
Almoço de Natal, que acontece no dia 25 de dezembro na comunidade do Parque São
Bernardo."
Distante, muito distante da nossa história oficial, há gente
obreira, que atua em sua comunidade sem qualquer imposição de ordem financeira
ou poder, sempre visando o bem comum. Estamos diante de dois desses casos e o
depoimento de ambos nos convence da dimensão de seus respectivos papéis de
cidadãos comprometidos.
"Seu" Marotti ou "Marotinho", como é
carinhosamente chamado por muitos, assumiu seu compromisso social, sem o saber
ainda, quando, menino. Levado por seu pai, participava ativamente de todas as
atividades festivas do bairro. Erguia o pau de sebo, hasteava bandeira e
acendia a fogueira nas festas juninas. Assim, foi tomando gosto e não mais
deixou de se dedicar às causas da cultura popular, sempre envolvido com a gente
ao redor (o bairro, a cidade).
E é com o envolvimento diário com sua comunidade, quer como
festeiro, passando o livro de ouro entre conhecidos para, desde 1956, manter
seu clube em plena atividade, cedendo sua sede à comunidade que necessita
daquele espaço, quer como treinador de futsal feminino, campeã invicta nos
jogos regionais, trabalho reconhecido que o levou e à sua equipe à Itália.
Transformar sua já tradicional festa junina e sua quadrilha
premiada em megaevento para "turistas" jamais passou pela cabeça do
seu Marotti, homem simples que toca essas atividades, com a mesma autenticidade
que seu pai as mantinha nos anos 50 do Século passado, pelo simples prazer de
servir, pelo simples prazer de fazer, provocar pertencimento às gentes do
lugar, a festa no sentido mais amplo do paganismo e da religiosidade, exercício
para a verdadeira Ágora. Aos 83 anos, permanece ativo e pronto a seguir com seu
louvável trabalho comunitário.
Ditinho da Congada, começou seu depoimento assim: " A
cultura vem da resistência e essa resistência vem de mais de 100 anos, começa
com minha avó que nasceu em 13 de maio de 1888.. Minha tia ia no baile e só
dançava com quem a tirasse para dançar antes da meia noite, porque depois da
meia-noite, os homens só tiravam as pretas e as mais feias e ela dizia que
"não era defunto amanhecido".
Continua: "Meus pais decidiram vir para São Bernardo em
1963. Meu pai (Antonio Lemes, já falecido) trazia do interior de Minas, colher,
prumo, nível e braços fortes. A proposta de meu pai era não voltar para a
cidade natal, de onde saíra magoado. Com meu primeiro abono (Ditinho, hoje
aposentado, foi metalúrgico durante 15 anos e posteriormente funcionário
público, serviço onde permaneceu até a aposentadoria), comprei as passagens e
voltamos."
Foi esse contato com as raízes, com as festas de cunho
popular e, em especial, a Congada que
seu pai praticara antes com seus respectivos pais, que fez surgir a ideia de
montar uma Congada em São Bernardo. Corria o ano de 1979.
"Montamos o grupo em 1980, meus 8 irmãos e 4 primos.
Como não sei cantar como meu irmão que canta muito bem, fiquei com o apito e,
intuitivamente, comecei também a usar um bastão que até hoje uso para comandar
o grupo."
A primeira apresentação foi em 1981.
"Eu não sabia então que todos os grupos de Congada
levavam nome de santo, o nosso não. Montar um grupo de Congada com o nome de
"Parque São Bernardo", local tido como o "cordão da miséria"
foi uma atitude política.
Começamos a dançar na rua, no dia em que não tinha tiroteio,
mas o povo acabou achando que no dia que tinha "barulho" da Congada
não havia tiroteio e a própria imprensa acreditou nisso, quando estampou em
manchete que "Congada de São Bernardo traz paz". Na verdade, tínhamos
"aviso" dos "chefes" do local, que nos liberavam ou não
para a dança."
O grupo, hoje com 50 integrantes, cerca da metade composto
por familiares, ganhou reconhecimento ao longo destes anos, tendo se apresentado
em palcos prestigiados, como Memorial da América Latina, Oficina Três Rios,
SESC, Revelando São Paulo e programas de TV como Som Brasil entre outros. A
história do Grupo foi também objeto de estudo em nível de Mestrado por
Jefferson Dias Corrêa, PUC, SP, sob o título "Grupo Folclórico Congada do
Parque São Bernardo e a Construção da Liberdade".
Mas as atividades da numerosa família Lemes não se limitam a
dançar congada, o que já não seria pouco. Um almoço comunitário para 50
crianças no já distante natal de
1999, idealizado por seu irmão José e
elaborado por sua mãe, Maria do Carmo, a D. Cotinha, com a ajuda de toda
família, chegou neste último Natal a ser servido para 5.000 pessoas, tendo
ainda à frente D. Cotinha, hoje com 87 anos e o acréscimo de muitos
voluntários.
Exercer a arte e servir são coisas que combinam bem na
família Lemes, do qual Ditinho é legítimo representante. (dalila teles veras).
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