Simone Massenzi
Savordelli
Foi a primeira vez que participei
de uma conferência e a experiência foi válida por ver como se forma o debate e
como o povo anseia por voz. O povo precisa falar o que sente, o que pensa, e
sobre o que deseja como retorno da atuação da gestão pública.
No geral, esta conferência
permeou o debate aberto, com permissão para que todos pudessem expor suas
demandas, buscando manter o objetivo central da conferência subdividido nos
eixos de implementação do sistema nacional de cultura; produção simbólica e
diversidade cultural; cidadania e direitos culturais; e cultura e
desenvolvimento. Mas, houve embates, como é próprio do confronto de ideias e
opiniões e o que mais adiante tentarei relatar.
Após a abertura com a fala do
Secretário de Cultura, Osvaldo de Oliveira Neto, com ênfase na sustentabilidade
das ações culturais, na importância da participação popular e na arte
transformadora e como bem maior para a cidade, veio a fala do Prefeito Luiz
Marinho.
Aqui já surgem alguns
questionamentos. O Prefeito salientou sobre tantos pontos ainda por serem
realizados em decorrência de que a Secretaria de Cultura é uma secretaria jovem
e que ainda depende de estruturação e é este o problema. A Secretaria
implantada em 2009, após três anos ainda depende de estruturação. Para uma
cidade tão dinâmica como São Bernardo e que tem demonstrado grande
desenvolvimento nos últimos anos, três anos é muito tempo para se falar em
falta de estruturação de uma secretaria tão importante quanto às outras.
Muito embora se diga e se reconheça
que muitas ações foram implementadas e que há boa vontade, no meu entender, o
povo espera e quer mais. Mais atuação, mais certeza e mais dinamismo nas respostas.
Nota-se da analise do que foi realizado após a 1ª Conferência a notícia de que,
daquilo lá deliberado, se realizou apenas 38% sob a justificativa de que não
havia estrutura até então.
A esperança, do verbo esperançar,
não nos deixa esmorecer e assim espero que, de fato, após tantas manifestações
populares cobrando por uma seriedade política e administrativa, as pedras do
caminho sejam colocadas no acostamento e à estrada se deem os largos passos
necessários para uma condição de vida melhor, aí incluídas as questões
culturais.
Ainda com referência à fala do
Prefeito, ele colocou que a riqueza cultural não pode ficar restrita tão
somente à produção de artes, mas deve abranger o comportamento cultural da
sociedade e também ter em conta o “padrão de cultura” que a cidade almeja e que
o processo de transformação depende da continuidade de projetos.
As palavras ditas, ou escritas,
são bem colocadas, mas a realização é outro passo. A maior dificuldade de todas
é exatamente a continuidade de projetos que, em regra, se são paralisados,
esquecidos e abandonados até mesmo dentro de uma mesma gestão, quem dirá em
gestões posteriores que agem como se tudo o que foi feito fosse ruim e sempre
zeram o cronometro. Enquanto isso, a sociedade sofre!
Sim, compartilho da opinião do
Prefeito pela continuidade dos projetos e mais, das ações, do pensamento, do
debate e do entendimento daquilo que vem a ser política pública de cultura,
mas, até hoje não vi nada que me dê tranquilidade para acreditar na
continuidade. Aliás, a continuidade seria a melhor forma de atribuir
sustentabilidade às políticas públicas de cultura, salvo melhor juízo! Aqui
mais um ponto de reflexão, fiscalização e cobrança.
Nesta primeira parte da
conferência, teve a fala do Professor Doutor Dennis de Oliveira que além de ser
professor na USP, atua como consultor em comunicação, educação e cultura em
instituições públicas, particulares e organizações não governamentais.
Esta parte, mais teórica, embasou
o pensamento e a reflexão não só sobre os temas propostos nos eixos, mas
contribuiu para a instrução e informação dos participantes atentos, com enfoque
à diversidade cultural, à expressão cultural libertadora e a cultura como
direito a ser pensado com a construção de conhecimento coletivo e da pessoa
como portadora de ideias e valores. O pensar com objetivo no sujeito mais
humano, com mais vivência e não somente como sujeito de consumo, diante da
transformação da era da produção para a era da informação.
Assim seguidos os debates sobre a
palestra apresentada, as críticas foram fortes e no sentido de que as políticas
públicas atuais não geram nenhuma mudança real na essência da sociedade, e é de
se pensar!
Neste ponto, onde o norte será a
parte mais burocrática da conferência e em que passou-se à aprovação do regimento,
saliento que no credenciamento foi entregue um envelope com vários prospectos,
com o regimento, com o texto base dos eixos e com a ordem dos trabalhos. E o
detalhe é que os trabalhos foram iniciados sem a leitura previa da ordem do
dia. Já que havia uma ordem estabelecida e escrita, nada mais justo que fosse
lida para a concordância de todos uma vez que dentro de um processo democrático
de participação popular. Mas não foi lida e quando se chegou à fase da
aprovação do regimento, eis que surge o auge do embate, no meu ver, com uma
postura que evidencia uma tentativa de limitação da liberdade de expressão.
Na ordem do dia, um momento
estava dedicado à apresentação das moções da seguinte forma, que merece ser
transcrita: “Os/as participantes só poderão apresentar moções que tenham como
conteúdo o tema central e os eixos temáticos da Conferência Nacional de
Cultura; Somente serão aceitas moções que forem assinadas por 20% ou mais dos
credenciados na conferência; As moções serão recebidas pelos representantes da
COE – Comissão de Organizadora e Executiva, devidamente identificados e
divulgados pela coordenação dos trabalhos. As moções só serão permitidas até o
final do trabalho dos grupos temáticos; Caberá à COE – Comissão de Organizadora
e Executiva da Conferência Municipal de Cultura – deliberar sobre a
admissibilidade das moções; As moções deverão ter, no máximo, uma lauda e não
poderão substituir as deliberações da II Conferência Municipal de Cultura.”
Da simples leitura, sinto a
repressão. A apresentação de moções foi aprovada e passou a constar no
regimento, mas sem nenhuma especificação de limitação quanto ao seu conteúdo,
ou quanto à necessidade de quantidade mínima de assinaturas para ser apreciada.
Aliás, neste ponto, a coordenadora chegou a dizer que tal limitação estava
prevista no Código Civil.
Não me lembro de ver alguma
disposição no Código Civil de como deve ser regida, exatamente, uma moção. Me
parece que o lugar adequado para dispor sobre as regras de apresentação,
apreciação e aprovação da moção seria o próprio regimento da conferência e se
ali nada estiver disposto, a própria conferência por intermédio de votação na
plenária poderia, de forma democrática, estabelecer os parâmetros.
Mas as regras, neste ponto foram
impostas. Após debates, o conteúdo das moções passou a ser livre, desvinculado
da temática da conferência. Um avanço, mas só. No mais, só foram apreciadas e
votadas as moções que continham o número mínimo de assinaturas.
A moção, caracterizada como
“proposta, numa assembleia, sobre o estudo de uma questão ou a propósito de
incidente que ali surja” (Aurélio), no meu entender não pode encontrar limite
de conteúdo. É o momento de expressão democrática norteada pelo bom senso
daquele que propõe a moção e que deve ser apreciada por todos. Limitar o seu
conteúdo e a sua análise é o mesmo que limitar a liberdade de expressão.
Registro que, eu mesma, somente tomei conhecimento de uma moção, todas as
outras que atingiram os requisitos necessários para serem apreciadas não
passaram pelas minhas mãos, logo, não sei se ali teriam outras moções, além
daquelas que foram levadas à apreciação da plenária, que eu teria assinado, ou
não... Creio ser um processo falho e a ser repensado para conferências futuras.
Quanto aos trabalhos distribuídos
por eixos, não compreendi a divisão dos grupos de trabalho. Cada eixo contou
com dois grupos separados de debates e de apresentação de diretrizes. Enquanto
eu estava em um grupo, havia outro debatendo o mesmo assunto e eu não poderia
saber o que ali estava sendo pensado, desenvolvido e criado. Por mais que a
quantidade de pessoas possa criar um entrave ao debate, no mesmo passo a
quantidade de pessoas pode enriquecer o debate. Voltamos à plenária sem saber
quais seriam as diretrizes do outro grupo do mesmo eixo.
Mas o ponto positivo foi que, ao
menos no eixo em que participei, o debate foi muito democrático e os
coordenadores dirigiram os trabalhos sempre respeitando todas as opiniões e
tentado fazer com que todas as diretrizes fossem elaboradas de modo a atender
da forma mais ampla possível aos anseios ali expostos.
Sinto que o tempo foi muito curto
e em decorrência disto não houve a possibilidade de expor todas as demandas que
eram necessárias. Neste ponto, creio que a conferência deveria ser pensada para
ser realizada com uma amplitude maior de tempo, prestigiando mais o debate.
Talvez fazer uma conferência de
dois dias: um dedicado à abertura, palestra, aprovação do regimento, debates
nos grupos de trabalho e elaboração das diretrizes e outro para a exposição das
diretrizes e aprovação, moções, eleição dos delegados e encerramento.
Precisamos falar, precisamos de tempo para argumentar e para trocar
experiências e vivências.
Também compactuo das opiniões de
que há a necessidade de se terem pré-conferências, com o chamamento da
sociedade para a participação em tão importante processo de democracia.
Não é possível que tudo seja um
primor, mas é possível construir um caminho e se a sociedade se fizer ouvir,
vamos conseguir.
Por fim, a crítica à própria
sociedade que clama por melhores condições, mas ainda participa pouco. Foram
apenas 172 inscritos. Esperava mais participação popular. Será que é porque é
sobre cultura?
Vamos disseminar o conceito de
cultura como agregador da formação da pessoa e do pensamento crítico. Cultura
não é um produto mercadológico, cultura é a estrutura essencial de um povo.
Cara Simone, para quem debutou em conferência (como você afirmou no início do seu texto), percebe-se que esteve presente de corpo e alma.Parabéns!!!
ResponderExcluirParafraseando o falecido Celso Furtado: a cultura de um povo revela a qualidade do seu desenvolvimento.
Obrigada Neusa! Sempre com o incentivo dos amigos...
ResponderExcluirSimone M.