Vanessa Molnar*
Após refletir sobre a importância
da inserção do município (Santo André) no Sistema Nacional de Cultura,
decidi participar da Conferência Livre que aconteceu ontem na UFABC e acredito
que, como a maioria dos Produtores Culturais presentes, me senti bastante
contemplada na fala do Dramaturgo Abreu quando ele mencionou a
bipolaridade das Políticas Públicas de Cultura na nossa região e sua respectiva
aversão à política moderna, fundada por Maquiavel, como um mero jogo de
correlação de forças que tem como único objetivo ganhar e manter o poder,
ressaltando a incompatibilidade natural desse viés com o trabalho criativo dos
artistas, que é um trabalho fundamentado em valores humanos que estão em crise
na nossa sociedade.
Eu, particularmente, tenho uma
relação de amor e ódio com essa cidade a qual pertenço. Tive experiências
significativas na minha formação/inserção que me foram propiciadas por
momentos positivos de gestão cultural que tive a sorte de vivenciar, seguidos
de imensos vazios que transformaram a cidade em um deserto cultural, apesar, é
claro, dos pequenos focos de resistência que fazem parte da História
Cultural da região.
Minha participação, ontem, em um
módulo específico voltado para a reflexão das práticas educacionais e sua
relação com a cultura me levou a refletir sobre minha própria trajetória.
Afinal, não posso deixar de dizer que fui para a Conferência com uma vaga
sensação de inércia e até de culpa por uma persistência meia nonsense (Deixar
meu filho de 3 anos no domingo tendo um trabalho de 40 horas semanais, não
é fácil) e se eu não morasse do lado da Universidade, provavelmente não
teria ido. Participo da vida cultural dessa cidade há exatos 21
anos ( Há 21 como público/usuário e há dez como produtora de forma
escassa). Aos dezesseis anos assumi a presidência do grêmio da minha
escola (Pública), posicionamento político humanista que (apesar das
desilusões) até hoje me define, e exerci uma militância intensa
no movimento estudantil que me levou a ser vice-presidente da UMES, me
decepcionei com o Partido dos Trabalhadores e PC do B, ao qual fui filiada
e tive a sorte (devido ao meu esforço) de estudar na USP,
onde pude aprofundar meu parco conhecimento relativo as relações ou,
como alguns preferem, Ciências Sociais, pelas quais fui apaixonada (Hoje
menos, confesso). Depois de formada e de um longo divórcio com a cidade, resolvi
abraçar a literatura como o principal alicerce de significação da minha
existência.
Há mais uma série de fatos
relevantes que poderia descrever, mas, no fundo, acho que decidi participar da
conferência porque estou profundamente incomodada com essa fixação de
valores não humanos que estão sendo disseminados como algo natural. Brincando
com alguns amigos, que tive a sorte de reencontrar, nós chegamos a
conclusão de que o mundo está passando por uma Revolução do Neo-
Conservadorismo: Protestos contra os direitos das empregadas domésticas,
mercantilização de tudo em grau cada vez mais elevado, sucateamento e falência
total do Ensino Público, Feliciano e tantas aberrações.
Talvez eu ainda teime em
resistir por causa do medo imenso que tenho ao pensar no mundo que
meu filho herdará se não houver resistência a esse projeto de desumanização
total que está sendo implementado e vendido de forma tão agressiva sob o matiz
alegre do consumo fácil, padronizado e irresponsável.
Sei que cheguei em casa com a
sensação de ter feito uma boa escolha, independentemente dos resultados da
conferência (que foram positivos), alegre por ainda conseguir resistir, por ter
reencontrado os amigos (amigos de trajetória) e ver que não sou a
única que persiste, por ter conhecido novas pessoas e verificar que,
apesar das naturais nuances, elas ainda sonham, por enxergar a
possibilidade de novas perspectivas e sobretudo por ter entendido
que, afinal de contas, eu pertenço a esse lugar.
.............................
*Vanessa Molnar é escritora,
autora do livro Crônicas de Uma Tara Gentil, Prêmio PAC e Historiadora.
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