Neusa Borges
O povo brasileiro tem tanto apreço pelas festas juninas, que elas já estão também se tornando “julhinas”, ou seja, em pleno mês de julho, ainda há muitas festanças em clubes, chácaras, salões paroquiais...
Tempos atrás, escolas da rede municipal de ensino da Região deixaram de realizar as festas, sob a alegação de que, sendo o estado laico e as manifestações estarem ligadas aos santos da igreja católica, tais práticas contrariavam dispositivos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. No entanto, não foram poucas as críticas que surgiram nas redes sociais, pelo fim de algo de tão forte apelo popular.
Nos dias atuais, a educação precisa atentar para que o aprendizado das disciplinas como matemática, português, história, geografia, entre outras, não prescinda do respeito ao multiculturalismo que há numa sala de aula. O que significa que não dá mais para admitir que algumas práticas do passado continuem vigorando, pois, muitas delas, até mesmo violavam direitos humanos. No entanto, no caso da proibição das festas juninas na rede publica de ensino, por exemplo, corre-se o risco de vermos as futuras gerações perderem o contato com uma das mais ricas manifestações da cultura popular tradicional. Sem contar que a questão poderia ter sido debatida com a sociedade civil.
O fato é que, quando os educadores são ousados e comprometidos em fazer a diferença, uma festa que muitos até poderiam chamar de junina, por conter elementos característicos do gênero, pode virar uma verdadeira aula sobre a vida e obra de um artista que apresentou o Nordeste ao Brasil. Foi o que aconteceu num sábado do dia vinte e três de junho, na EMEB Irmã Odete, na Vila São Pedro - localizada em região periférica de São Bernardo do Campo -, ocasião na qual as educadoras e equipe gestora daquela unidade de ensino organizaram uma festa junina que foi, sobretudo, uma linda homenagem a Luiz Gonzaga - o Rei do Baião -, que neste ano completaria cem anos de vida.
Os alunos da EMEB (de 5 a 6 anos), que pesquisaram sobre Gonzagão, viram seus trabalhos expostos por todos os espaços da escola; no palco improvisado na quadra esportiva, revezaram-se grupos de forró da comunidade (na Vila/Cidade São Pedro, com 23 mil habitantes, segundo o último Censo do IBGE, tem muitos forrozeiros), que cantaram músicas do repertório do homenageado, tendo ao fundo o belo painel retratando Luiz Gonzaga com sua inseparável sanfona, confeccionado pelo cineasta Milton Santos - ô, cabra “bão”!
Num cantinho do salão, um telão exibia vídeos sobre a vida do artista; crianças e adultos, todos davam uma paradinha para ver as imagens. Enfim, foi uma festa bastante especial; as centenas de pessoas (de todos os credos) que por lá passaram, se divertiram bastante e, ainda, tiveram a possibilidade de um mergulho no rico universo de um dos maiores gênios da nossa música.
Quando os profissionais exercem o seu ofício com brilho nos olhos, a exemplo da educadora Roseli Ortigoso, que, mesmo às vésperas da sua aposentadoria, ainda se empenha e se envolve de corpo e alma nos projetos que abraça, fica a certeza de que a escola pode, sim, ser espaço para se vivenciar grandes experiências coletivas.
A equipe da EMEB Irmã Odete nos deu um grande exemplo de como é possível fazer com que as irmãs educação e cultura caminhem de mãos dadas.
O cordel abaixo, de autoria de Sueli Porfírio, que, no dia do evento, ficou afixado num painel na entrada da escola, revela muito sobre o espírito da festa.
Festa Junina
A falta dessa festança
Há muito tempo lamentamos
Discutimos na pedagógica
E todos juntos planejamos
Um encontro diferente
Com apoio da comunidade
Queremos reunir toda a gente
Cultura com muita dignidade
Estudamos direitinho
Para erros não cometermos
Teve pesquisa e tudo
Então à história recorremos
Festa Junina é pura cultura
Que se espalhou pelo mundo
Por isso se não acontece
Fica um vazio profundo
Vamos contar nesse cordel
Que dá gosto de relatar
Sobre a Festa Junina
Que é bastante popular
Na Europa ela surgiu
De lá veio pro Brasil
Para aqui se consagrar
Essa festança é marcada
Pela grande animação
Tem roupa bonita e milho assado
Tem foguete e tem balão
Quadrilha para todo lado
É xote, baião e xaxado
Relembrando Gonzagão
No Nordeste Brasileiro
Virou mesmo tradição
Se espalhou para todo lado
Do Oiapoque ao Chuí
Não ficaremos de fora
Vamos comemorar agora e aqui
A festa é dia 23
Vai ter muita coisa gostosa
Como não poderemos vender
Comida vai ficar lá fora
Tudo com muita segurança
A igreja e comerciantes da Vila
Vão caprichar pra comilança
Do lado de dentro só cultura
Brincadeira e exposição
Baile, shows, folia pura!
Aqui dentro também faremos
Homenagem ao rei do baião
Vamos brincar, dançar e comer
Uhhuuuu! Eita trem bão!
Os equivocos que existem em relação aos eventos da cultura popular tradicional deixou de fora uma das festas mais tradicionais dos espaços públicos da educação. Felizmente existem pessoas que superam as dificuldades causados por estes equivocos e conseguem realizar atividades maravilhosas que consegue envolver toda a comunidade independente da cor da pele, dos credos, da posição social, etc...
ResponderExcluirEstão de parabéns os organizadores do evento, e que mais e mais pessoas batalhem para derrubar as barreiras erguidas em razão dos equivocos.