Simone Massenzi Savordelli
Dizem que o ano começa somente após o carnaval.
Muito embora o carnaval seja uma festividade cultural amplamente inserida na vida de todos os brasileiros, ou, ao menos na vida da maioria dos brasileiros, é difícil acreditar que uma boa parte das decisões e das ações fique pendente para após o carnaval.
Tudo bem que o carnaval acontece justamente na época do verão (sol, praia, verão e carnaval – a cara de um país tropical). Tudo bem que esta época é a mais propícia para as merecidas férias de tantos trabalhadores e tudo bem que o carnaval acontece logo no início do ano letivo. Mas com um “feriado” (que não é feriado) tão perto de tantos momentos de descanso (que, de fato, todos nós merecemos) tenho, particularmente, certa dificuldade em entender o motivo pelo qual tantos assuntos ficam à espera do passar o carnaval.
Até aqui foi um tipo de desabafo e um tipo de colocação do carnaval não só como uma expressão cultural do brasileiro mundialmente difundida, mas também como um marco para dizer que os fatos da vida continuam, sempre.
Assim como os fatos da vida continuam sem interrupções e independente de momentos histórico-culturais, como se representa o carnaval, as questões debatidas ao longo de tantos anos sobre políticas públicas de cultura também continuam. Continuam pendentes e continuam sendo debatidas.
Neste ano de 2012 nós (do Fórum) já nos reunimos e pude constatar que iniciamos o ano colocando em pauta assuntos que frequentemente retornam à pauta justamente por uma falta de continuidade na aplicação daquelas demandas que são amplamente debatidas e levadas à apreciação pelos que devem zelar pela boa condução das questões sociais e para a sociedade. Iniciamos debatendo a necessidade de continuidade dos debates, de continuidade das ações por parte dos que governam.
As questões ficam latentes. Vê-se uma grande preocupação pela “política dos eventos”. Não obstante a anotação, os eventos culturais são igualmente importantes pois deveriam ser o resultado último da aplicação de outros projetos mais amplos e profundos. Os eventos materializam o lazer da população como um todo que espera ver grandes espetáculos e materializam os objetivos dos produtores culturais e dos artistas que esperam ver seus projetos realizados, seu trabalho reconhecido e sua arte apreciada por muitos.
Mas não é só. O evento, como a própria denominação indica, começa e acaba. Enquanto que a cultura num sentido mais amplo merece um trabalho contínuo, ininterrupto cujas ações iniciadas encontrem guarida e continuação nos governos seguintes e, até mesmo, dentro dos próprios governos.
Creio que seja hora de pararmos de nos resignar com a política do “tudo é assim mesmo” e colocarmos as nossas necessidades de forma insistente para que aqueles responsáveis por nós (já que os elegemos para tanto) percebam que suas funções são tão importantes quanto qualquer outro “trabalho”. Que muitas pessoas esperam e dependem de que os olhos de quem deve fazer vejam adiante e continuamente e que debates e projetos apresentados pela sociedade como uma demanda necessária sejam realizados e tenham ações contínuas.
É necessário que se inclua no debate de políticas públicas a continuidade das ações para que os assuntos não se percam e para que aqueles responsáveis pela condução da carruagem sempre pensem em deixar tudo pronto para o próximo condutor e para que este próximo condutor tenha plena consciência de que continuar algo é tão valioso e importante (ou mais) que começar algo novo. O sempre começo (ou recomeço) tem uma probabilidade de nunca encontrar um fim, enquanto que a continuidade tem uma probabilidade de encontrar um fruto e este crescer e gerar novos frutos.
É necessária a urgente mudança da mentalidade social para pensarmos em termos de resultados concretos, aparentes e duradouros. Para inserirmos a cultura como um meio de formação social.
Por outro lado, mesmo parecendo um círculo vicioso aonde temos um sentimento de que sempre estamos debatendo um tema, uma demanda que já foi debatida e que volta à pauta pela falta de continuidade na ponta seguinte, nós que debatemos e que lutamos para apresentar as necessidades da sociedade podemos nos desanimar em alguns momentos, mas não podemos desistir. Nós continuamos: pensando, debatendo, esperando e fazendo o que nos é possível fazer.
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